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Corações feridos

O divórcio é uma experiência dolorosa que afeta todos os membros da família

O divórcio não deve ser visto apenas como um problema do casal. Os filhos em geral não participam do processo, apesar de sofrerem as consequências das decisões e atitudes dos pais. Geralmente, o filho de famílias separadas reage de forma negativa à nova situação. Seu rendimento escolar cai, a agressividade pode aumentar, e ele pode se isolar do resto do mundo.

Para muitos casamentos em crise, o divórcio tem se tornado a saída mais fácil para resolver a situação. Divórcio (do latim, prefixo “di” + “vertere”, significa voltar em direção oposta), em geral, tem o sentido de divergir de maneira irreversível. De forma específica, a legislação brasileira aplica o termo a uma ruptura total e definitiva da união conjugal, que permite aos cônjuges contrair novas núpcias.[1]

O impacto dos lares desfeitos pelo divórcio na sociedade brasileira é incalculável. Segundo dados do IBGE,[2] no Brasil há mais de 14 milhões de casais separados e divorciados. Em apenas dez anos, o número de divórcios duplicou por aqui. Em nosso País homologam-se cerca de 200 mil processos legais de separação por ano. Um em cada quatro casamentos terminará em divórcio, e um entre cinco bebês por nascer viverá numa família de pais separados antes de atingir a idade adulta.

O divórcio costuma ser uma experiência dolorosa e dificilmente é um processo fácil, mesmo que a mídia tente vender essa imagem. Ele pode produzir marcas difíceis de ser superadas e pode afetar não só o casal envolvido, mas também os filhos e os demais membros da família, colegas de trabalho, membros da igreja e vizinhos.

Para Jim Smoke, citado por COLLINS,[3] quando um casal resolve se separar, identificam-se três estágios sobrepostos nesse processo:

No primeiro momento, vem a fase do choque, em que a pessoa se dá conta de que “isso está acontecendo comigo”. A relação que começou com juras de amor eterno está terminando com sentimentos confusos, ressentimentos e perplexidades. Esse momento pode provocar atitudes opostas em pessoas diferentes. Enquanto alguns se fecham em seu mundo, outros falam sobre o problema com todas as pessoas que encontram. Alguns preferem ficar sozinhos, enquanto outros procuram se envolver em muitas atividades para procurar esquecer o que está acontecendo. Alguns sentem culpa e fracasso, enquanto outros se portam de forma arrogante e amarga.

O segundo momento é a fase de ajuste. Isso inclui o “luto positivo”, quando a pessoa relembra os bons momentos do casamento, e o “luto negativo”, quando a pessoa mergulha em um mar de autopiedade e culpa. Também existe o processo de “reunir os pedaços”, quando alguém se reorganiza para aprender a viver sem um companheiro.

A fase do crescimento é a próxima. Durante ela, a pessoa lida com mais maturidade com os próprios sentimentos e com a nova condição de vida; assim, há espaço para a reflexão e a luta contra o sentimento de desprestigio que brota. .

Por que os casais se separam?

Não existe uma causa única para o divórcio. A separação pode acontecer por uma combinação de vários fatores e circunstâncias. Não se pode entendê-la com explicações simplistas. Entre as principais causas de separação, podem-se destacar as seguintes:

1. Desilusão com o casamento — Falsas expectativas podem comprometer o futuro do casamento. Para entender por que as pessoas se separam, seria preciso entender o porquê de elas terem se unido. Peterson[4] identificou quatro mitos sobre o casamento que contribuem para a sua instabilidade:

a) Casamentos são feitos no Céu. Esse mito é a crença de que só existe uma pessoa certa para cada um. É a chamada “alma gêmea”. Se Deus escolheu o meu cônjuge, posso ter certeza de que o casamento vai dar certo. É a ideia do matrimônio por encomenda. Essa compreensão pode criar algumas dificuldades quando houver problemas no relacionamento matrimonial. A pessoa poderia colocar a culpa em Deus, transferindo a responsabilidade pelos erros na relação para outra esfera. Além disso, esse mito poderia levar a uma falsa segurança, despreparando o casal para enfrentar os atritos e discórdias que acontecerão posteriormente. Por fim, pode se tornar num motivo para o divórcio, pois se houverem problemas, o casal pode imaginar que essa relação não era da vontade de Deus.

b) Existe um papel definido para cada pessoa no casamento. Quando as pessoas se casam com visões rígidas sobre a função de cada um no matrimônio, podem criar-se frustrações que levam ao divórcio. Segundo a visão bíblica, quando se enfatiza que a mulher deve ser sujeita ao marido (Efésios 5:22), podemos também esquecer que ter autoridade não é o mesmo que ser líder. Na visão bíblica, a liderança deve ser exercida para servir ao próximo (Mateus 20:25-28). Além disso, o apóstolo também ordena aos maridos que amem a esposa (versículo 25).

c) O casamento me tornará feliz. Levados pela mídia, que glamoriza o casamento, muitos sofrem da “síndrome do conto de fadas”: “E viveram felizes para sempre”. É a ideia de que o amor supera todas as dificuldades, enfrenta a tudo e a todos e é suficiente para manter o casal unido para sempre. O que mantém o casamento não é o amor, mas a aliança [voto matrimonial] que se faz com a pessoa que se escolhe para dividir com ela a vida. Esse falso romantismo leva a pessoa a imaginar que a felicidade suprema será trazida pelo outro, pelo cônjuge. Na verdade, a pessoa deve casar para fazer o outro feliz e não para que o outro a faça feliz.

Algumas pessoas se casam para superar traumas e fracassos do passado. “Os problemas do casamento trarão de volta o passado, e o passado determinará como nos haveremos com os problemas. O seu passado influenciará o seu casamento mais do que o seu casamento irá alterar o seu passado.”[5]

d) Os filhos vão manter o casamento unido. Pais imaginam que, ao se concentrarem na educação de uma criança, as diferenças entre os dois desaparecerão. Acontece que “os filhos não resolvem os problemas conjugais; eles os revelam, os agravam.”[6] A educação dos filhos pode ser fonte de vários desentendimentos, como as questões relacionadas com a disciplina e a instrução. Ao investir toda a atenção no filho, o casal pode se esquecer de que um dia a criança crescerá e irá embora para formar a própria família, e que, no fim, só restarão os dois. Nesse momento, os pais podem descobrir que não têm nada em comum entre si, e, à medida que o filho crescia, distanciaram-se um do outro e se tornaram dois estranhos. O divórcio pode acontecer como resultado da chamada síndrome do ninho vazio.

Os quatro mitos matrimoniais anteriormente têm uma coisa em comum: o pensamento de que a união matrimonial não é responsabilidade da pessoa, mas sim do outro.

2. Infidelidade conjugal — Segundo Martins, a “infidelidade conjugal é um dos maiores motivos diretos de separações no meio evangélico.”[7] No meio secular, a traição não tem o mesmo peso sobre o relacionamento do que no ambiente cristão. A reconciliação após a infidelidade é difícil porque a parte “inocente” “sente-se traída, rejeitada e ferida. Torna-se difícil acreditar que o cônjuge merecerá confiança no futuro, e quase sempre subsiste a ira e um sentimento de que a autoestima do indivíduo foi prejudicada.”[8]

Por que os cônjuges se traem? Para Peterson, a resposta não é simples e única: (1) Imaturidade emocional dos cônjuges; (2) dificuldades em resolver conflitos que surgem no casamento; (3) necessidades insatisfeitas; (4) falta de atenção por parte do cônjuge; (5) sentimento de não aceitação; (6) falta de afeição e atitudes carinhosas no relacionamento; (7) perda da capacidade de admirar o parceiro, e (8) casamento que cai na rotina.

3. As brigas e desentendimentos — Muitos se casam imaginando que nunca vão brigar, discutir com, ou mesmo discordar do cônjuge. Quando não há atritos no namoro, eles pensam que o casamento será assim também. Acontece que no dia a dia as opiniões não são convergentes, e pode haver diferenças entre o casal. Nesse momento, a falta de flexibilidade pode dar origem a desentendimentos e brigas. O conselheiro matrimonial Joaquim Martinez Mariodema escreveu:

“Todos os casais, em maior ou menor escala, têm suas brigas e querem que o outro se curve às suas imposições. Imposição é o ato pelo qual se tende a intimidar o cônjuge para obrigá-lo a aceitar uma direção determinada ou uma decisão unilateralmente tomada. A briga, porém, é uma manifestação de desconformidade, ou então a luta sobre quem tem direito de fazer alguma coisa, ou quem tem razão na discussão sobre algum ponto determinado.”[9]

Muitos casais não conseguem se manter unidos sob tantos desentendimentos, e as crianças ficam divididas entre um lar divorciado e sem desavenças e a insegurança quanto ao futuro que as constantes brigas provocam.

4. Imaturidade na educação dos filhos — Existe uma ideia que prevalece entre alguns casais, de que os filhos podem consertar um casamento. Levando em consideração os dados estatísticos sobre divórcio, podemos concluir que isso não é verdade. Segundo Peterson, “Os filhos não resolvem os problemas conjugais; eles os revelam, os agravam. Eles são muito maus conselheiros matrimoniais. Em vez de aliviar as tensões maritais, eles as aumentam. As falhas encobertas serão expostas, e esses amorzinhos vão precipitar um terremoto.”[10]

A criação de filhos pode ser fonte de discórdias entre os pais. Eles podem não concordar sobre qual é a melhor maneira de discipliná-los e instruí-los. Um cônjuge pode ser mais permissivo enquanto outro pode ser mais autoritário. Percebendo essa divisão entre os pais, os filhos se aproveitam das fraquezas em seu próprio favor jogando um dos pais contra o outro, e isso pode separá-los ainda mais.

Outro problema está relacionado à mãe. Ao nascer o bebê, ela vive em função da criança, e a relação com o pai cai para um segundo plano. O inverso também pode acontecer. Até mesmo a doença e a morte de um filho poderiam ter efeitos desastrosos sobre a relação do casal.[11]

5. Interferência de parentes e amigos Embora não apareça como a principal causa de separação, a interferência de familiares a amigos poderá levar ao divórcio, combinada com outros fatores. Essa interferência pode se originar nas questões financeiras.

“Enquanto viviam na casa dos pais, os filhos dependiam deles para sua sobrevivência. Já casados, não devem continuar esperando deles o suprimento de suas necessidades financeiras. É possível que até inconscientemente os sogros comecem a manipular os genros e noras, filhos e filhas, porque mensalmente dispõem de seu dinheiro para auxiliar o casal, que por sua vez se sente tolhido em sua liberdade.”[12]

Com o tempo, como o homem não exerce a função de “provedor”, ele acaba por se desmoralizar inconscientemente diante da esposa e família.

Outra fonte de interferência pode ser a dependência emocional que um dos cônjuges sente pelos pais. Isso pode se manifestar quando o filho compara a esposa com a mãe constantemente, ou quando a sogra se sente roubada do afeto e da atenção do filho pela nora.

Por isso, Kemp recomenda:

“Para que a nova vida dos recém-casados possa seguir seu curso normal, o cordão umbilical necessita ser cortado. Isso não significa que os filhos cortarão o contato com seus pais ou que irão abandoná-los. Mas ambos, homem e mulher, assumirão novas junções prioritárias. Eles passam a ser, antes de filho e filha, marido e mulher.”[13]

Por fim, se um dos cônjuges pretende manter o estilo de vida de solteiro depois do casamento, isso pode ser fonte de tensão e finalmente levar ao divórcio.

6. As reações dos filhos diante da separação dos paisA criança percebe as dificuldades na relação dos pais antes mesmo que o problema seja expresso. Embora não se possa predeterminar a reação de cada criança diante da separação dos pais, é possível definir as principais características de cada faixa etária diante dessa verdadeira tragédia.

a) Idade pré-escolar. Antes dos quatro anos, a criança não compreende a separação dos pais e tende a sofrer pouco. Mas é comum elas mostrarem “sinais de regressão a um estágio anterior de desenvolvimento.”[14]

Depois dessa fase, a situação muda completamente. Como as crianças ainda não entendem direito as noções de tempo, causa e efeito, surgem algumas confusões mentais. Para ela, se um pai vai embora, o outro também vai. A criança na fase pré-escolar tende a apresentar fortes sentimentos de culpa. Ela acredita que seu mau comportamento levou um dos pais a sair de casa. Nessa fase, é comum a criança explodir em crises de irritação.

b) Idade escolar. Com a separação dos pais, as crianças, dos seis aos oito anos, apresentam a seguintes reações: tristeza profunda, sentimento de responsabilidade pelo que acontece, medo irracional de ser abandonada (e até de passar fome) e fuga para um mundo de fantasia.[15]

Nessa fase, o maior problema para a criança é lidar com a divisão emocional que a separação provoca. A pesquisadora Linda B. Francke explica:

“Num dos enigmas da separação, quanto menos uma criança de seis, sete ou oito anos de idade vê o pai ou a mãe que não ficou com a sua custódia, tanto mais ela deseja ficar com ele ou com ela. Ao mesmo tempo, quanto mais a criança vê o pai ou a mãe que não ficou com a custódia, tanto mais ela tem saudade do pai ou da mãe que ficou em casa. Nesse entrechoque de emoções, eles parecem infelizes onde quer que estejam.”[16]


c) As crianças mais velhas. Nessa fase, a criança usa o ódio como defesa contra os sentimentos de choque e contra a depressão. Segundo Hart:

“Esta ira é geralmente dirigida ao pai (ou mãe) que ela acredita ter iniciado o rompimento, mas que é facilmente desviada para fora da família e recai sobre os amigos, justamente num período em que o apoio de amigos bondosos é mais necessário. As crianças podem afastar os mais íntimos, inclusive professores e parentes próximos.”[17]

Nesse caso, cabe um conselho prático da educadora Cris Poli: “Filho agressivo por causa de um casamento desfeito é filho carente que tem, além de tudo, dificuldade de expressão. Bastará apenas um pouco mais de compreensão e empenho dos pais para torná-lo mais calmo e mais feliz.”[18]

Outro transtorno causado pelo divórcio é o comprometimento do desenvolvimento espiritual da criança. Isso acontece porque ela vê os pais como hipócritas. Eles ensinaram as normas, mas não vivem de acordo com elas.[19]

d) A adolescência. Essa é a fase mais difícil da convivência familiar. Isso acontece porque a criança está passando por profundas mudanças físicas e emocionais. “É comum que se isolem e se recusem a falar do que as perturba. Os adolescentes também sentem agudamente o ‘dilema da lealdade’.”[20]

O adolescente contesta a autoridade dos pais, mas paradoxalmente sente segurança nas normas por eles estabelecidas. É essencial para o adolescente ter um modelo. Por isso, quando os pais se separam, ele busca essa referência em qualquer pessoa que admire.

Os pais separados ainda vão enfrentar um desafio a mais na educação do filho adolescente ao ter de lidar com uma sexualidade precoce provocada pelo divórcio. Outra característica típica dessa fase da vida que se acentua é a rebeldia, sem que nem o jovem nem os pais entendam bem por que isso acontece.

e) Idade adulta. Nessa fase da vida, a separação dos pais não é tão traumática para os filhos, pois a compreensão e a aceitação do problema são maiores. Muitos deles já esperavam o fim do casamento dos pais por terem acompanhado a relação deles por tanto tempo. Os filhos de casamentos desfeitos tardiamente sentem vergonha de conversar sobre o assunto e têm medo de que essa situação se repita no próprio casamento.

7. O comportamento dos pais em relação aos filhos após a separaçãoSobre a atitude mais comum adotada pelos pais litigiosos durante o divórcio em relação aos filhos, Poli comenta:

“Muitos pais, sobretudo após o fim do casamento, costumam transferir aos filhos os próprios medos e a própria insegurança, gerando neles comportamentos inadequados que depois não toleram e passam a censurar. As crianças, com toda a razão, tornam-se insuportáveis, e os pais perdem o controle da situação.”[21]

O divórcio pode afetar não só a relação entre os filhos e os pais, mas também a relação dos pais para com os filhos. Essa interferência depende muito de como aconteceu a separação, de como os pais conduziram o processo, da idade dos filhos, do temperamento e de outros fatores. Por serem muitos os fatores, vamos analisar apenas os principais:

a) Nervosismo crescente. A tensão pós-divórcio afeta drasticamente os pais. Em geral, no primeiro ano após a separação, o relacionamento dos filhos — especialmente dos meninos —, com o pai ou a mãe se torna mais explosivo, e a comunicação entre eles se deteriora. Então começa o ciclo coercivo das exigências das mães separadas e dos filhos desafiadores. Muitos pais acabam descarregando as frustrações sobre os filhos, o que provoca a mesma reação neles, contribuindo para piorar a relação.

b) Superproteção. A superproteção é uma reação comum logo após a separação. O progenitor que fica com a guarda do filho quer compensá-lo pelo trauma que está vivendo. Essa atitude permissiva dos pais é acompanhada pela indisciplina dos filhos, que querem testar os pais para saberem o quanto a situação mudou e o quanto continua estável. Essa situação infantiliza a criança.

Também existem pais que querem compensar a ausência do dia a dia na vida do filho com presentes. Poli comenta que:

“Essas atitudes de compensação dos pais ocorrem, na verdade, porque eles não conseguem expressar bem o que sentem, não conseguem expor suas emoções mais íntimas. Assim, compram presentes para os filhos com a intenção de preencher as lacunas de seu relacionamento com eles porque, devido a dificuldades pessoais, não sabem supri-las.”[22]

Essa situação prejudica ainda mais a relação dos pais com os filhos, pois para contrabalancear a atitude “generosa” de um pai o outro é forçado a desempenhar o papel de repressor realista.

c) Culpa. Mesmo quando os filhos se desenvolvem como adultos maduros, os pais costumam sentir a impressão de que falharam em algum ponto. Quando acontece o divórcio, é comum os pais se sentirem invadidos pelo sentimento de culpa. Esse sentimento é de difícil identificação, mas pode prejudicar a relação com os filhos. Conforme Hart:

“Os modos como tentamos reduzir nossos sentimentos de culpa são intermináveis e qualquer deles pode surgir numa situação de divórcio. Um pai (ou mãe) pode tornar-se excessivamente generoso e ceder a todas as exigências do filho. Outro pode evitar a responsabilidade ou o contato com o filho, chegando até a mudar-se para o outro lado do país para afastar-se ao máximo e aliviar assim os sentimentos de culpa. É claro que todas essas táticas para reduzir a culpa são injustas e prejudicais para a criança. Elas criam confusão, desconfiança e sofrimento para a criança, mais do que avaliam os pais.”[23]

8. As consequências da separação para os filhosQue efeito tem a separação definitiva dos pais sobre os filhos? Isso depende de vários fatores. (1) Como a separação está em processo, quanto maior a pressão e os conflitos nessa fase, maior será o impacto negativo sobre as crianças. A indefinição prolongada quanto à situação da família pós-divórcio pode ser fonte de conflito e angústia para os filhos. (2) A idade da criança influencia, pois quanto menor a criança, maior a dificuldade para ela entender o que está acontecendo. Ela pode reagir à situação de diversas formas: com agressividade, atitudes regressivas (como chupar o dedo, fazer xixi na cama etc.), com temores, pesadelos etc. Já a criança na idade escolar, que é capaz de entender melhor a situação, tende a reagir com tristeza, sentimento de perda ou diminuição do rendimento escolar. Quando adolescente, o filho pode tomar partido e assumir a responsabilidade de proteger o lado que ele sente estar mais fragilizado pela situação.[24]

A forma como a criança compreende o divórcio dos pais e o significado que lhe atribui, pode levá-la a se sentir culpada, revoltada ou assustada, conforme os casos. O apoio que recebe dos pais ou de outras pessoas próximas nessa fase é fundamental.

O divórcio produz impacto em várias dimensões da vida dos filhos:

a) Impacto econômico. Segundo pesquisas, os filhos são os que mais sofrem com a consequente queda do padrão de vida causado pela separação dos pais. Um ano depois do divórcio, enquanto 42% dos homens divorciados melhoram o padrão econômico-financeiro, as mulheres divorciadas e os filhos experimentam 73% de declínio. Além disso, o índice de pobreza entre crianças de lares desfeitos é cinco vezes maior do que o daquelas que vivem com os pais.

b) Impacto nas relações sociais. Crianças que frequentam a escola e moram com pai/madrasta ou mãe/padrasto têm maior probabilidade de repetência ou expulsão por problemas de comportamento. Os índices variam entre 40 a 75%. A grande maioria das crianças que foge de casa vem de lares de pais separados.

c) Impacto no comportamento. Adolescentes que viveram o drama da separação dos pais tendem a manter relações sexuais prematuramente, a casar-se cedo, a engravidar antes do casamento e divorciar-se, mais do que aqueles que crescem em lares estabilizados.

d) Impacto nas emoções. Os filhos do divórcio costumam ser tomados por sentimentos de raiva e depressão. Como o corpo não pode manter-se no estado de tensão e vigilância contínua que o divórcio provoca, doenças psicossomáticas quase sempre são o resultado desse estado de coisas. O modo como os filhos lidam com as emoções que surgem do divórcio vai depender da idade. O pré-escolar (de 1 a 6 anos) ficará frequentemente amuado, resmungando, choramingando, perdendo a alegria da infância.

Nessa fase, “é importante que [a criança] possa continuar a estar com cada um dos pais, mesmo quando apresenta dificuldade em separar-se quando tem que regressar à sua casa. Os pais terão o papel de compreender as emoções do filho e proporcionar a resposta adequada.”[25]

O pré-adolescente (de 7 a 12 anos) revelará raiva e depressão, receio de ser abandonado, tristeza demasiada e preocupação com a lealdade que precisa manifestar ao pai e à mãe. Nesse momento, “a forma como a ruptura do casal é justificada e comentada no dia a dia constitui uma referência para a criança.”[26]

O adolescente (de 13 a 18 anos) manifestará sentimentos negativos de maneira mais direta e específica, e acaba por tomar partido em favor de um dos pais.

Conclusão

O divórcio é, depois do luto, a experiência mais traumática pela qual uma família pode passar. Seu impacto produz marcas que podem acompanhar as pessoas por toda a vida e afetar também suas relações futuras. Ignorar os sentimentos negativos gerados pela situação de separação não ajuda a superá-los.

Por essa razão, o matrimônio deve ser levado mais a sério pelo povo de Deus. É por isso que Deus aborrece o divórcio (Malaquias 2:16, Nova Tradução na Linguagem de Hoje). O casamento é um contrato vitalício. Por isso, Ellen G. White comenta:

“Na mente juvenil, o casamento se acha revestido de um romance, e difícil é despojá-lo desse aspecto com que a imaginação o envolve, e impressionar o espírito com o senso das pesadas responsabilidades compreendidas nos votos matrimoniais. Esses votos ligam o destino de duas pessoas com laços que coisa alguma senão a mão da morte deve desatar.”[27]



Referências bibliográficas:

[1] ÁVILA, Fernando Bastos. Pequena enciclopédia de moral e civismo. Rio de Janeiro: Campanha Nacional de Material de Ensino, 1967. Verbete “Divórcio”, p. 173.

[2] KEMP, Jaime. Antes de dizer adeus. São Paulo: Mundo Cristão, 1999.

[3] COLLINS, Gary R. Aconselhamento cristão. São Paulo: Edições Vida Nova, 1986, p. 166.

[4] PETERSON, J. Allan. O mito da grama mais verde. Rio de Janeiro: JUERP, 1992.

[5] PETERSON, Op. Cit., p. 70.

[6] Ibidem, p. 72.

[7] MARTINS, Edson. Curando as feridas. Rio de Janeiro: JUERP, 1998, p. 18.

[8] COLLINS, Op. Cit., p. 164.

[9] Apud in Martins, Op. Cit., p. 19, 20.

[10] PETERSON, Op. Cit., p. 72.

[11] Idem.

[12] KEMP, Jaime. A arte de permanecer casado. São Paulo: Sepal, 1989, p. 25.

[13] Ibidem, p. 24.

[14] HART, Archibald D. Ajudando os filhos a sobreviverem ao divórcio. São Paulo: Mundo Cristão, 1998, p. 38.

[15] HART, Op. Cit., p. 38; MARTINS, Op. Cit., p. 32.

[16] Apud in Martins, Op. Cit., p. 33 e 34.

[17] HART, Op. Cit., p. 39

[18] POLI, Cris. Pais separados, filhos preparados. São Paulo: Editora Gente, 2007, p. 51.

[19] HART, Op. Cit.

[20] Ibidem, p. 39.

[21] Ibidem, p. 109.

[22] POLI, Op. Cit., p. 117.

[23] HART, Op. Cit., p. 70.

[24] MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2011, p.1.

[25] PINA, Op. Cit., p. 5.

[26] Ibidem, p. 6.

[27] Testemunhos seletos, vol. 1, p. 576.